sexta-feira, 7 de novembro de 2008

Formação de Professores

Impossível falar da formação de professores sem antes compreender qual a função de um docente. Há quem diga que é meramente transmitir conhecimento. Mas muitos educadores e pensadores defendem que é mais do que isso, que sua função é formar um sujeito autônomo e crítico capaz de atuar e interferir na sociedade em que vive. E sem essa clara definição de atribuições fica difícil saber o quê é ser um bom professor. E mais difícil ainda definir sua formação adequada.

O magistério, como profissão, não tem sido devidamente valorizado. Há décadas os professores reivindicam melhores condições salariais. Entendo que isso em parte se deva justamente a uma visão do professor como apenas alguém que transmite um conhecimento. E isso pode ser feito por ‘qualquer um’, até mesmo pelas TICs. E é nesse sentido que vejo uma exacerbada valorização do uso das TICs nas escolas, muitas vezes em substituição ao papel do professor. Se a função do professor está limitada à transmissão de conhecimento, como valoriza-lo? Hoje, até mesmo a formação dos professores se utiliza de recursos das TICs para realizá-la através da educação à distância, na formação inicial e na continuada mais fortemente.

È de suma importância que se aprofunde a discussão no sentindo de se encontrar uma clara definição sobre o papel do professor e suas atribuições. E a participação dos próprios professores é fundamental nesse processo. Se quisermos uma educação de qualidade é preciso dar voz àqueles que fazem à educação em nosso país.

Financiamento e Gastos Públicos

O discurso do governo de que investir em educação é importante parece não se refletir na prática. Segundo dados divulgados pelo IPEA, de 1995 a 2005 o investimento do governo federal em educação caiu em relação ao PIB. Em média sabe-se que o investimento público em educação, somados os investimentos federais, estaduais e municipais, gira em torno de 4% do PIB. Vale destacar que a recomendação da ONU é de que seja algo em torno de 7%. Fica difícil então acreditar em um discurso quando na prática sabe-se que o atual governo deixou de gastar mais de R$ 20 bilhões em educação no período compreendido de 2003 a 2007 segundo dados divulgados através da mídia.

Segundo relatório Educação num Olhar 2007 divulgado no ano passado pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), de 36 países desenvolvidos e em desenvolvimento pesquisados pela entidade, o Brasil é o que menos investe em educação e ainda distribui mal o que gasta. Na Constituição está previsto que o governo federal deve aplicar no mínimo 18% da receita arrecadada com impostos para a Manutenção e Desenvolvimento do Ensino (MDE). Porém, em 1994 foi instaurada a Desvinculação de Recursos da União (DRU) que permite ao Poder Executivo gastar 20% da sua receita tributária da maneira que desejar. Portanto, a obrigatoriedade do investimento de 18% em educação passa a ser aplicada sobre o que sobre deste valor.

O fato é que história da educação no Brasil nos mostra um quadro de descontinuidade quando se fala em vinculação de recursos financeiros para a educação. Vinculação essa que foi retirada por duas vezes da Constituição Brasileira com os golpes de 1937 e 1964. Atualmente isso está assegurado pela Constituição Federal de 1988.

Em 1998, o governo instituiu o FUNDEF cuja meta era incentivar o aumento do número de matrículas do ensino fundamental para estimular seu desenvolvimento. Pela lei, o município deveria aplicar na educação um percentual da sua receita com a arrecadação de impostos para o desenvolvimento do ensino fundamental público e do magistério. Porém, ao atrelar parcela dos recursos à matrícula dos alunos no ensino fundamental regular, o FUNDEF acabou ocasionando um processo de municipalização do ensino em nosso país. Isso seu deu porque este fundo acabou tornando-se extremamente atrativo para alguns administradores municipais que estavam querendo e precisando de recursos. Com isso, em alguns municípios a preocupação em captar recursos se sobrepujava ao interesse no investimento de qualidade para o ensino. Esse é um dos pontos polêmicos do FUNDEF. Ao municipalizar o ensino, o governo federal acabou centralizando os recursos em um único fundo e que nem sempre os recursos arrecadados são destinados para a educação tendo sido muitas prefeituras denunciadas por desvio de verba do FUNDEF. Isso mostra a fragilidade deste sistema de financiamento.

Mais recentemente, em 2006, o governo lançou o FUNDEB, que veio para substituir o FUNDEF. O aspecto positivo deste novo fundo é a ampliação dos recursos para financiamento para toda a educação básica. Contudo, o atual sistema de financiamento ainda apresenta fragilidades. Como conseqüência da municipalização houve um desequilíbrio entre a quantidade de alunos matriculados e os recursos financeiros que o município possui. Ou seja, hoje os municípios têm mais alunos matriculados do que sua capacidade de financiamento. Isso no longo prazo com o término do FUNDEB tende a piorar. O Doutor em educação e professor José Marcelino de Rezende Pinto em seu artigo “A Política Recente de Fundos para o Financiamento da Educação e seus efeitos no Pacto Federativo” chama a atenção para a gravidade desta situação. Ele nos diz que o sistema de financiamento só não entrou em colapso porque o FUNDEF, e agora o FUNDEB, transferem recursos de uma esfera de governo para a outra. Ele ainda acrescenta que, considerando a transitoriedade dos fundos, em 31 de dezembro de 2020, quando terminará o FUNDEB, se nenhuma medida for tomada os municípios se encontrarão em situação muito crítica. Sem a existência de um fundo como o FUNDEB e a capacidade de se auto financiar a situação da educação na rede municipal ficará caótica.

Além dos problemas já citados pelo Doutor e professor José Marcelino, ele também ressalta que questão crucial da política de fundos refere-se ao valor disponível por aluno. No caso do FUNDEF era grande a disparidade entre os estados da Federação e os valores por aluno eram muito reduzidos. Com relação ao FUNDEB ele ressalta que haverá alteração pouco significativa nos recursos por aluno. E que ao se considerar o valor médio por aluno a tendência é que com o FUNDEB haja uma diminuição perante o valor propiciado pelo FUNDEF. Ele traz ainda em seu artigo que o valor estimado para o FUNDEB fica 71% abaixo do valor estimado como necessário para se garantir um padrão mínimo de qualidade em Estudo feito pela Campanha Nacional pelo Direito à Educação (Carreira & Pinto, 2007). A conclusão é que embora o FUNDEB represente um avanço com o resgate da educação básica, há ainda questões importantes a serem melhoradas como, por exemplo, o estabelecimento de um valor mínimo por aluno que assegure um ensino de qualidade.

Mas, o que muitas vezes ocorre é uma verdadeira disputa por recursos entre estados e municípios; e, para evitar esta disputa, muitos autores apontam como saída a criação de um sistema único de ensino, não importando se a escola pertence ao estado ou ao município. Essa solução somada a uma gestão democrática, parece ser um caminho interessante a ser percorrido ou ao menos experimentado. Uma única escola para todos, gerida com a participação da comunidade escolar e sociedade civil organizada parece ser uma saída bastante democrática.

Para concluir, é importante que as luzes estejam acesas no palco da educação, pois esse direito social precisa ser assegurado pelo Estado. Urge que se pense e se estude a ampliação do percentual do PIB destinado à educação. Sem a ampliação de recursos fica cada vez mais distante a meta de se oferecer uma educação pública de qualidade.

Políticas Públicas

Para que o Estado possa assegurar o direito constitucional da educação para todos, através da criação e implementação de políticas públicas ou programas governamentais, são necessários recursos financeiros. Historicamente a principal fonte desses recursos tem sido a vinculação de percentual da arrecadação de impostos para financiamento da educação. Porém, a descontinuidade dessa vinculação em dois momentos (golpe de 1937 e golpe de 1964) teve um impacto muito negativo na educação pública brasileira.

A situação piorou durante período do governo militar quando, além de desvincularem os recursos para as instituições públicas, promoveram políticas que beneficiavam as instituições privadas de ensino como, por exemplo, a recomendação aos Estados de que não criarem estabelecimentos públicos de ensino onde os estabelecimentos privados fossem suficientes para atender as demandas. Além disso, criaram uma política de isenção de impostos para os estabelecimentos privados e também um mecanismo de aporte de recursos financeiros. Com isso, assistiu-se ao crescimento e domínio das instituições de ensino privado e o declínio do ensino público. A classe média migrou para as escolas particulares e as escolas públicas tornaram-se escolas para pobres. Cenário este que permanece até os dias atuais.

Na década de 1980, com o fim da ditadura e em meio a um processo de transição democrática as políticas públicas começaram a ganhar relevância. Foi quando a vinculação voltou e foi assegurada pela Constituição Federal de 1988. A década de 1990 acabou sendo marcada por reformas educacionais com o intuito de modificar e melhorar a educação brasileira. Em 1998, foi implementado o FUNDEF cujo foco era o ensino fundamental obrigatório e gratuito. E, mais recentemente, com a criação do FUNDEB, o Estado ampliou o financiamento para todo o ensino básico. Nessa mesma época o governo lançou o Plano de Desenvolvimento da Educação (PDE) cuja prioridade é o investimento em uma educação básica de qualidade. Importante dizer que o PDE apresentado pelo MEC não contou, na sua elaboração, com a participação de setores organizados da sociedade brasileira, de representantes dos sistemas de ensino e de setores do próprio Ministério. Ou seja, uma elaboração pouco democrática. Como acreditar então que um plano que se dispõe a resolver o problema da qualidade da educação não teve a participação de todos os envolvidos? Como acreditar em um plano cuja concepção político-pedagógica está pautada em uma lógica de mercado e que secundariza a participação da sociedade e da comunidade escolar nos destinos da escola?

Por isso ressalto o princípio da gestão democrática como uma das questões mais cruciais quando se fala em política pública. Pois, no meu entender e muitos autores também têm o mesmo entendimento, as políticas baixadas por decretos têm poucas chances de serem efetivas e eficientes, pois acabam caindo no esquecimento e muitas vezes não reflete e não se aplica à realidade de determinada escola ou comunidade. Políticas assim tendem a ser homogêneas e a não respeitar as diversidades. Em um país do tamanho do Brasil e com tantas desigualdades, uma gestão centralizadora como se tem assistido nas últimas décadas tende a ser ineficaz. Não dá para se falar em políticas direcionadas à gestão da educação sem considerar a participação de todos. Se a educação é para todos, todos precisam ser envolvidos, todos precisam participar da construção desta educação. Isso é democracia.

Pelos motivos supracitados, entendo como fundamental o envolvimento e participação de todos os envolvidos e interessados, como pais, professores e gestores. Mas isso, possivelmente por herança de décadas de ditadura, ainda é um tema frágil e em muitos casos polêmico. Mas sem uma gestão democrática da educação as chances de sucesso de qualquer política pública, por mais recursos financeiros que se tenha, diminuem sensivelmente. No Brasil, alguns autores apontam que ainda há muito que ser feito pelo Estado para garantir a participação da sociedade civil nas políticas públicas de educação. Portanto, esse me parece estar entre os maiores desafios para a educação brasileira.

Educação, um direito de todos

Está assegurado pela nossa Constituição Federal de 1988 que a Educação é um direito de todos. A primeira pergunta que nos fazemos diz respeito a possibilidade de se implantar um sistema educacional de qualidade que atenda igualmente a todos em um país do tamanho do nosso e com tantas diferenças. E após muitas leituras e pesquisas a conclusão que chegamos é que sim é possível. Mas, para isso, duas coisas são necessárias e igualmente importantes: vontade política e recursos financeiros. É sobre isso e outros temas relacionados que sempre procuraremos discutir aqui. E sempre com o objetivo de contruibuir para uma discussão saudável a respeito de um assunto tão importante que é a educação.